-Não mais do que qualquer outra coisa
-Beber nao é uma doença?
-Respirar é uma doença
Vamos, não chores.
A infância está perdida.
A mocidade está perdida.
Mas a vida não se perdeu.
O primeiro amor passou.
O segundo amor passou.
O terceiro amor passou.
Mas o coração continua.
Perdeste o melhor amigo.
Não tentaste qualquer viagem.
Não possuis carro, navio, terra.
Mas tens um cão.
Algumas palavras duras,
em voz mansa, te golpearam.
Nunca, nunca cicatrizam.
Mas, e o humor?
A injustiça não se resolve.
À sombra do mundo errado
murmuraste um protesto tímido.
Mas virão outros.
Tudo somado, devias
precipitar-te, de vez, nas águas.
Estás nu na areia, no vento...
Dorme, meu filho.
Poucas chances,
Poemas experimentais,
Filosofia existencial,
Novas velhíssimas canções,
Alguém que muito te gosta,
Mas que te causa repulsa,
Alguém que você gosta mas que diz:
Você é interessante,mas não estou interessado,
Ah! a eterna quadrilha de Drummond...
Sessão de cinema,
Vinho tinto,
Um disco novo daquela banda,
Eh! quem sabe as coisas melhorem...
Acho que Nietzsche tinha razão quando disse que Deus está morto.
Em caso de dor ponha gelo
Mude o corte de cabelo
Mude como modelo
Vá ao cinema dê um sorriso
Ainda que amarelo, esqueça seu cotovelo
Se amargo foi já ter sido
Troque já esse vestido
Troque o padrão do tecido
Saia do sério deixe os critérios
Siga todos os sentidos
Faça fazer sentido
A cada mil lágrimas sai um milagre
Caso de tristeza vire a mesa
Coma só a sobremesa coma somente a cereja
Jogue para cima faça cena
Cante as rimas de um poema
Sofra penas viva apenas
Sendo só fissura ou loucura
Quem sabe casando cura
Ninguém sabe o que procura
Faça uma novena reze um terço
Caia fora do contexto invente seu endereço
A cada mil lágrimas sai um milagre
Mas se apesar de banal
Chorar for inevitável
Sinta o gosto do sal do sal do sal
Sinta o gosto do sal
Gota a gota, uma a uma
Duas três dez cem mil lágrimas sinta o milagre
A cada mil lágrimas sai um milagre
Lembro daqueles dias de caos quando demonstrávamos ao mundo toda a nossa incoerência, e que por ser a idade das máximas manifestações de tolices, nem nós notávamos o quanto tudo aquilo não fazia o mínimo sentido, e nem os outros conseguiam perceber a falta de lógica, mas por ser aquela fase também a que dava inicio as percepções mais apuradas, tanto nós como eles tinham a certeza de que algo ali estava errado. Nós respondíamos a isso perpetuando aquela atitude insana, e eles a respeitavam como se fosse um ritual sagrado.
Foi um ano de tentativas arriscadas, queríamos sustentar um mundo inteiro em um tripé onde cada perna possuía uma altura diferente, e só quem já teve o desprazer de tentar se equilibrar em uma cadeira de três pernas, sabe o quanto o trabalho é árduo. Mas as circunstancias nos levaram a forçar essa união, e quando demos por si já não estava mais em tempo de ativar o campo de retração, o vinculo havia sido formado.
O ritual aos poucos foi se tornando sagrado. De segunda a sexta, lá estávamos nós, o que dava marco ao inicio do ritual era o tocar do sinal que anunciava o termino da aula, e o fato do nosso lugar ser estrategicamente localizado ao lado da porta nos garantia que saíssemos primeiro. Tinha-se algo que compartilhávamos ,o pânico do corredor no inicio e no final da aula. Os meninos do ultimo ano, na tentativa de firmar sua imagem de suposta superioridade, alinhavam-se encostados na parede, uma fila de ogros de cada lado, e quando os nerd’s, cdf ‘s e afins por ali passavam, eram feitos de bolas humanas, sendo literalmente arremessados de um lado para outro, com as meninas era diferente, aquele era o momento de cortejo, no momento em que as moças por ali passavam a animalidade era até amenizada. Mas conosco a atitude era outra, o espaço era aberto de modo que pudéssemos passar sem ser interrompidas, os mais ousados faziam sinais de educação com os olhos, mas mantendo sempre atitude de reverencia e respeito, fatos estes que indago o motivo até nos dias de hoje, mas estou quase certa de que era porque nossos atributos físicos não contribuíam.
Como havia dito, sempre éramos as primeiras a sair no termino das aulas, e eis que tinha inicio o ritual. Eu, a passos largos ia ao encontro de minha bicicleta, a moça dos cabelos roxos sempre tinha algum caso pendente com algum bípede do sexo oposto para resolver, a outra, a mais imponente entre nós, era quem garantia que o ambiente do nosso ritual fosse mantido desocupado. E em questão de minutos lá estávamos nós, a posição era sempre a mesma, eu e a moça imponente de um lado e a moça dos cabelos roxos do outro, e nossas pernas no meio do caminho impedindo a passagem de todos – ou quase todos -, aquela esquina havia se tornado o comitê dos nossos encontros e debates. Primeiro esperávamos todos saírem, havia certa glória em ver aquelas pessoas pelas quais nutríamos uma antipatia desmedida terem que desviar seus caminhos pela rua, e chegávamos a cogitar possibilidades de nos aproximarmos dos que ousavam pular nossas pernas, de fato nunca nos aproximamos – com exceção do caso Lasek Junior - , mas apesar de mantermos distancia, os ousados ganhavam nosso respeito, alguns até conseguiram fazer com que tirássemos as pernas no caminho para que pudessem passar, mas foram raros. O ultimo a passar era sempre o admirável professor de química, eu e a moça imponente o víamos como modelo de homem ideal - apesar da química -, a moça dos cabelos roxos naquela época já se livrava dos últimos parâmetros de seletividade que lhe restava, e nesse caso, o via como ideal pelo simples fato de ser homem.
Quando percebíamos que nada mais iria interromper iniciávamos a conversa, cada assunto era discutido em seus pormenores, nunca saímos de lá sem antes tomar inúmeras decisões, que a cada dia se alteravam substancialmente, íamos de suicídio a casamento - que dá quase na mesma – de futilidades a situação monetária do país, discussões filosóficas quase sempre fomentadas por aquela professora principiante que só eu e a moça imponente ouvíamos, nos torturávamos a cada dia que passava com a tão difícil escolha do curso para o vestibular, e tantas outras irrelevâncias.
Como era de se esperar, o desequilíbrio só poderia resultar
Preferia não pensar tanto assim em você, mas meu lado humano-fraco-e-imerso-no-sentimentalismo-barato impede que a racionalidade atue nesse setor. O afeto que há em mim, que só se manifesta em/para ocasiões/pessoas especiais, costuma ser muito atencioso com o meu estado psicológico, predominantemente perturbado; quando ele nota o quão feliz me faz uma existência tão humana e complexa, de imediato ele ocupa as vias centrais dos meus pensamentos e busca espaço para a expansão desse sentimento benévolo. E o sentimento brando e carinhoso por ti insistentemente cresce a cada dia.
Sairia em busca de remédios para o tédio, talvez chegasse a me render aos ópios habituais, poderia ingerir doses daquelas formulas mágicas que derrubam os muros do bom senso, ou então tragar aquilo que caracteriza um jovem do século XXI, me juntar aos modernos em seu ‘intercambio cultural’ orgiástico, deliciando-me com tantas presenças pornográficas fabricadas por encomenda. Eu gritaria meus ódios aos ouvidos presentes, cairia no riso junto com eles, participaria ativamente dos diálogos verborrágicos , zombaria de deus, clamaria por deus, cuspiria nos pés dos ateus que ali se encontrassem, carimbaria seus passaportes para o inferno, daria minhas gargalhadas reprimidas na face dos cristãos hipócritas, esfregaria em suas faces a verdade da impureza universal, faria deles motivo das mais cômicas chacotas.
Depois correria até o altar acenderia duas velas, uma para deus e outra para nietzche e voltaria em meios aos mortais, tão pura quanto antes.
Mas a situação ainda não pede medidas drásticas, apesar de a noite estar quente demais, da mediocridade estar presente, do tédio não dar trégua, do fracasso bater a porta, e da solidão estar aqui sentada ao lado com eu sorriso cínico e com aquele ar de superioridade que só é permissível aos vencedores, vendo as letras aparecer na tela vagarosamente devido à presença da delicada preguiça que se encontra deitada na cama ao lado.
Céus, eu deveria rezar, se restasse fé, ou então eu poderia agir em uma espécie de reflexo condicionado místico e ao menos acender uma vela, mesmo sem fé nenhuma. Ou então eu poderia acender apenas um cigarro, ficar nas drogas licitas, colocar uma musica qualquer cheia de melancolia, e bancar o artista americano em mais uma cena deplorável que algum crítico bem pago e mal intencionado chamaria de arte; mas só um completo idiota ou alguém totalmente perdido sentiria qualquer espécie de animação em tal atitude, e acho que ainda não me transformei em uma completa idiota.
Mas também não poderia ficar esperando o ‘deus acaso’ virar as paginas do seu roteiro chatíssimo e me mostrar a nova cena onde eu provavelmente ainda estaria chafurdada no pântano da depressão.
Vamos à vida, menina, mas sem exageros, doses homeopáticas de decadência diária mantêm o homem vivo.
Não foi culpa do inverno, que chegou mais cedo do que o previsto, nem do tédio habitual que se vincula com a insônia para atormentar os dias e transformar as noites em momentos caóticos, o fato de todos os dias estarem impregnados com o cheiro de terça feira, de a redoma ter se partido em pedaços suficientes para impossibilitar a reconstrução, também foi mero detalhe.
(...)
É um amor desinteressado: Tereza não pretende nada de Karenin. Nem mesmo amor ela exige. Nunca precisou fazer perguntas que atormentam os casais humanos: será que ele me ama? será que gosta mais de mim do que eu dele? terá gostado de alguém mais do que de mim?
(...)
Mas sobretudo: nenhum ser humano pode oferecer a outro o idílio. Só o animal pode, porque não foi banido do Paraíso. O amor entre o homem e um cão é idílico. É um amor sem conflitos, sem cenas dramáticas, sem evolução."
As pessoas costumam ter suas atitudes agrupadas em duas categorias quando se trata da dor alheia. Temos aqueles que se assemelham a ‘livros de auto-ajuda ambulantes’, na primeira oportunidade que surge abrem seus sorrisos patéticos e miseravelmente felizes, com uma incurável visão seletiva dos fatos, e em questão de segundos deixamos de avistar a face do ser em questão, e nos deparamos com um Augusto Cury frustrado que na impossibilidade de escrever um livro cheio de atrocidades do tipo: ‘dez dicas para se feliz’, ‘você é insubstituível’, usa sua diarréia verbal para importunar um pobre ser possuidor de problemas corriqueiros e questões existenciais eternas, fazendo com que aquilo que não passava do resultado da condição humana imersa em acontecimentos decepcionantes, se torne motivo para o mais torturante suicídio, ou um violento homicídio, não mais pelo problema em si ou pela dor, mas sim pela ira que tal projeto mal desenvolvido de ser humano pensante nos causa.
Temos também aqueles que quando cruzam o caminho dos que admiram a categoria acima, são chamados com freqüência de chatos e incompreensíveis, eles se limitam a ouvir, só opinam quando existe alguma objetividade no que vão dizer, não tomam postura em relação ao problema alheio, nada de bancar o jesus cristo detentor da salvação, ou personificar o caminho a verdade e a vida, o máximo que fazem é ficar por perto, ou dispor de um abraço para derreter as camadas de orgulho, de raiva e de impaciência, tocando o coração do outro com a peculiaridade das coisas feitas para suavizar a crueza do mundo. Mas poucas vezes são compreendidos, principalmente quando se deparam com aqueles que limitaram a função dos sentidos apenas a ouvir e falar, e não entendem a sutileza e a complexidade dos sinais e do conforto dado pelos outros mesmo por um silencio ensurdecedor.
Ela temia que a realidade continuasse sendo seus anseios ao avesso, se assustava com a possibilidade das palavras serem eternamente proferidas como ruído obrigatório, queria ouvir apenas aquilo que não fosse mera transgressão do silêncio, ansiava enfim encontrar aqueles que não se preocupavam em calar, e que diziam apenas o indispensável, queria as palavras sentidas, os diálogos secretos entre as mãos, a comunicação discreta entre os perfumes, ela só podia sentir o coração dos que não se escondiam atrás das palavras, queria um amor calmo, que desse tempo para que todos os sentidos usufruíssem do mesmo, e com a mesma intensidade. (cansou de confundir taquicardia com amor).
Ela e ele no mesmo sofá. Um em cada extremidade, como se reconhecessem o lugar que a enorme barreira de distância deveria ocupar bem no meio deles. Ela pouco dirige a palavra a ele e a recíproca é verdadeira. Nem parece que antes se apertavam contra o corpo do outro, como se quisessem ocupar o mesmo pequeno espaço na cama, como se quisessem misturar o calor e ter a certeza que as essências estavam entrelaçadas até durante o sono. Notaram-se como estranhos, ela não poderia acreditar que ele estava lendo aqueles livros, e ele se sentiu envergonhado por ter dividido a mesma cama com uma mulher que agora tinha que pagar para alguém lhe dizer o que fazer. Sim, mas agora se tornaram desconhecidos, é fato. Tão distantes... Ela não suportou, mudou de sofá e tratou de procurar outras coisas pra se entreter, escondendo as mãos suadas. Incrivelmente portando-se com uma naturalidade mais cínica impossível. E provavelmente muito bem notada por ele, que ainda devia conhecer muito de seus artifícios e reações nervosas. Depois de um tempo, ele se levantou para ir embora e ela resolveu lhe lançar um olhar consideravelmente firme, na porta do apartamento enquanto o elevador não chegava, expressando um misto esquisito de sentimentos como se quisesse dizer "viu como eu estou bem sem você?" e "a saudade agora apertou como um sapato de número menor no calcanhar".
Deixe que essa noite eu cuido de você, puxe as cobertas que a noite está fria, deixe essa tristeza e chegue perto de mim. Deixa eu te embalar no sono, tirar seus medos, to aqui do seu lado, vem dormir, encosta sua cabeça em meus ombros, deixe-se dormir.
A noite vem, e vem escura, o vento já bate forte balançando as janelas, mas durma tranqüilo, estou aqui do seu lado.
Tirei a noite pra cuidar de ti, velarei teu sono, e se do teu sonho fizer parte, que seja dos mais belos passeios no parque de mãos dadas, ao raiar do sol, bem de manhãzinha, sentindo ainda o cheiro do orvalho por sobre as plantas.
Deixa-me ficar aqui, só te olhando, não farei barulho, prometo não te acordar, apenas ficar aqui te admirando.
Isso, assim mesmo, durma bem, enquanto fico aqui do seu lado, sem nada dizer, apenas imaginando o que poderia viver ao seu lado.
Dorme tranqüilo, estou aqui, te afagando com os olhos.
Por alguns segundos ela chegou a pensar que aquilo fosse excesso sensibilidade e escassez de compreensão, julgou-se injusta, pensou nunca poder se perdoar, de fato ela realmente havia sido dura demais com as palavras, mas foi a única saída que ela encontrou para tapear o seu ego, afinal, ele estava a deixando, ela se sentia no direito de vencer ao menos esse ultimo jogo de palavras, apesar de saber que diferente das outras circunstancias, o vencedor não poderia olhar para seu oponente com um olhar cheio de afeto e apertá-lo em seus braços, agora era definitivo, teriam que traçar caminhos opostos, mesmo sabendo que poderiam usar o mesmo percurso para sempre, compartilhavam das mesmas preferências em tudo, era justamente essa afinidade absurda que havia os unido. Mas ele decidiu partir. Ela compreendia o fim, sempre soube que os sentimentos eram findos, efêmeros, transitório, nunca esperou que ele lhe fizesse juras eternas, e nunca cometeu a atrocidade de fazer o mesmo, julgava-se racional demais, tanto que cometeu o erro de aplicar isso aos seus sentimentos a ponto de tornar-se fria, pensava que isso daria aos seus relacionamentos alicerces seguros, tudo parecia estável e dentro dos seus planos, fazia do amor um negocio, regras, investimentos, lucros, juros, tudo era pré-estabelecido com antecedência, o caminho até seu coração era mapeado, placas explicativas poupava todo o trabalho daqueles que ela permitia transcorrer por ele. Mas ainda assim, algo havia fugido do seu controle, ele avisara que partiria essa noite, mas como ela mesma disse aos gritos diversas vezes, o problema não era ele estar indo embora, nem ao menos o vazio que ela teria que enfrentar, ou o martírio que o medo da solidão lhe traria, ela só queria um motivo. As últimas palavras daquele homem que ela tanto amava foram responsáveis por uma angustia que ela levaria mais do que alguns dias, alguns livros, alguns filmes e vinhos para esquecer. O ópio habitual não seria suficiente. Ela esperava que os finais seguissem sempre o mesmo roteiro : duas ou três frases frias ou sarcásticas, reclamações explicativas em forma de pretexto, e o adeus. Mas ele não permitiu que ela ditasse as regras até o fim, segurou-a contra a parede, calou-a com seu ultimo beijo, deslizou seus dedos pelos cabelos dela delicadamente pela ultima vez, passou suas mãos pelo rosto dela, que nesse momento já estava umedecido por duas ou três lágrimas, e por alguns instantes se reportou ao primeiro encontro que tiveram, e notou que a pele ainda possuía a mesma suavidade, observou-a ... notou que estava mais bela do que nunca. Ela só lhe pediu um motivo, não que esperasse que ele não fosse, esse era um dos tantos motivos que fazia ela o amar tanto, ele não tomava decisões irrefletidas. E sem nenhuma crueldade ou ironias, ele listou as qualidades dela de forma impecável, suas palavras exprimiam a mesma doçura de sempre, dizia não haver motivos, simplesmente sentiu que aquele era o momento de partir. Por que ele estava partindo? Era tudo o que se podia escutar entre o choro e os soluços ... Ele havia profanado o ritual de partida.
O ambiente estava favorável para que ela se sentisse segura, a música adentrava seus ouvidos meigamente de forma quase imperceptível, o som havia sido minuciosamente preparado para confortá-la de deixá-la leve, o espaço fora escolhido de maneira que a manteria estrategicamente afastada de qualquer interrupção brusca, ele já sabia o quão frágil e vulnerável a sustos ela havia se tornado, nada indesejado ocuparia seu campo visual – como ela mesma costumava dizer – ela não escondeu seu riso ao perceber que aquelas cores só se faziam presentes porque a deixaria feliz, no fundo ela sabia que ele se sentiria muito mais seguro se as rosas fossem vermelhas – ele não compreendia como ela podia preferir as brancas. Na sua busca por informações, descobriu o quanto ela gostava de espelhos, e lá estavam eles por todos os lados, ela dizia que não era narcisismo, mas fazia o ambiente se tornar familiar, caso se sentisse angustiada poderia avistar sua própria imagem – ela sempre ria de si e analisava suas expressões faciais depois que algo inesperado que lhe causava emoções incontroláveis ao seu tão precioso bom senso acontecia . Em cada passo que ela dava percebia como ele havia assimilado bem suas palavras – e como suas mãos lhe foram gratas quando sentiram a maciez das inúmeras almofadas que ele colocara no sofá ,organizadas por cores e tamanho – ela sempre temia em pensar o que fazer com as mãos, tinha medo de que elas falassem algo inadequado, algumas leituras a respeito de linguagem corporal a deixou ainda mais cheia de paranóias. Ele deixou que ela decidisse a distancia entre eles, não conseguia compreender porque estava agindo daquela forma, depois de sentir o calor de tantos corpos e tê-los sob seu controle, tudo o que ele desejava agora é que ela escolhesse estar entre seus braços. Ela, com sua insegurança, bem provável que proveniente de sua imaturidade, se manteve um pouco distante, teve medo que ele percebesse que sua respiração ainda estava ofegante, ele por sua vez não deixou de notar, apesar de ter cogitado a possibilidade de ser efeito da subida das escadas, tinha medo da responsabilidade que sentiria se admitisse o quanto a desconcertava. A doçura com que ele a olhava a deixou incompreensivelmente segura, tomou para si as mãos dele, ele sorriu ao perceber o quanto um simples gesto havia exigido dela. Ficaram sem pronunciar uma palavra, nem um dos dois teve a audácia de correr o risco de estragar tudo com palavras, tudo era novo demais para ser dito.
Mantiveram as mãos e os olhos unidos, e apesar da incredulidade que compartilhavam, rezaram para que aquela noite fosse eterna. Ela não conseguiu resistir, os sentimentos estavam transbordando de tal forma que seria injusto demais não usar todas as maneiras que detinha para expressá-lo. Docemente pediu:
- Permite que eu viva nesses olhos?
Talvez o pecado dela tenha sido perder o interesse...
Ela que sempre havia sido tão aplicada na arte de conhecer e deliciar-se com as descobertas que o mundo lhe proporcionava, em um súbito instante, descobre que nada poderia ser mais aconchegante e lhe dedicar mais afeto, do que os seus travesseiros e seus lençóis sem estampa, dentro de si havia um conforto seguro, um amor sem duvida, que não necessitava que constantes conquistas, ela não teria mais que se confundir com cheiros e gostos, poderia se tornar neutra assim como as cores - tão criticadas - que ela sempre preferiu, mas abdicou em prol de outras sensações (e como ela se sentia livre e limpa na presença delas), foi como se essas cores tão sem graça e sem emoção – assim como ela – criassem vida, e lhe desse um abraço forte jurando que sempre a protegeria.
...o único esforço que ela teria que fazer era continuar sendo...