terça-feira, 31 de maio de 2011
segunda-feira, 30 de maio de 2011
Do que não deveria ser dito...
O mais decepcionante de tudo aquilo era que todas as pessoas firmavam-se na vida defendendo algo. Havia sempre alguma mensagem, nem sempre tão subliminar como deveria, ou como o bom senso sugeriria, ou até mesmo como o interlocutor gostaria, por traz de tudo aquilo que estavam dizendo ou fazendo, e eu sentia um prazer tão imensurável de contrariá-las, poder olha-las e encher a boca com o meu famoso "não concordo", era um dos prazeres pacaminosos que eu costumava acariciar para me manter existindo. E o que eu queria de fato não era convencê-los de seu falso ativismo, ou de que suas ideologias pouco (ou nada) fundamentadas não passavam de um credo fajuto, eu acreditava realmente na possibilidade redentora de ser convencida de algo. Mas ahhhh, como eram fracos os argumentos, pobres os discursos, tudo demasiadamente corriqueiro, todos absurdamente banais. E eu seguindo a cada dia mais cética e só...
domingo, 29 de maio de 2011
Álvaro de Campos
Ah a frescura na face de não cumprir um dever!
Faltar é positivamente estar no campo!
Que refúgio o não se poder ter confiança em nós!
Respiro melhor agora que passaram as horas dos encontros,
Faltei a todos, com uma deliberação do desleixo,
Fiquei esperando a vontade de ir para lá, que'eu saberia que não vinha.
Sou livre, contra a sociedade organizada e vestida.
Estou nu, e mergulho na água da minha imaginação.
E tarde para eu estar em qualquer dos dois pontos onde estaria à mesma hora,
Deliberadamente à mesma hora...
Está bem, ficarei aqui sonhando versos e sorrindo em itálico.
É tão engraçada esta parte assistente da vida!
Até não consigo acender o cigarro seguinte... Se é um gesto,
Fique com os outros, que me esperam, no desencontro que é a vida.
DEVANEIOS TOLOS
Tem se tornado idéia fixa a minha insistência em dizer que a vida é estranha.
Contudo, o que tomo como normalidade para atestar a estranheza da vida?
O que conheço da estranheza para atribuí-la a algo?
E o que, mais ainda, conheço da vida para adjetivá-la tão enfaticamente?
Estaria eu me aproximando do sentido verdadeiro daquilo que outrora observava de longe e chamava de vida?
Ou identificando a verdadeira personificação da estrenheza naquilo que executo como vida?
sexta-feira, 27 de maio de 2011
FATO
" Não gosto é quando pingam limão nas minhas profundezas e fazem com que eu me contorça toda"
(Lispector, Água Viva - p. 31 - 7ª ed. Nova Fronteira )
quinta-feira, 26 de maio de 2011
Das descobertas inéditas... [e do abuso descarado do pleonasmo]
O meu jeito era ser só. Havia habilidades naturais que me associava a tal característica. Aquilo que outrora amedrontava, agora parecia me cair maravilhosamente bem, por alguns segundo houve paz nessa falta de familiaridade.
Tornar-se um sujeito estranho, solitário, alheio aos arredores, ainda que temporariamente.
Havia certa graça, certo prazer e contentamento nessa condição que escolhera, depois abdicara, mas que por fim colhera.
Era estranho ver-se só, absolutamente só, pela primeira vez, o que antes seria separado apenas por uma parede, alcançado com a mesma facilidade do emitir um grito de desespero, agora faz-se milhas de distância, que possivelmente ultrapassara a esfera espacial para se tornar um muro psicológico intransponível.
[Pela primeira vez Clarice fez sentido objetivamente ao dizer: "Agora sei: sou só. Eu e minha liberdade que não sei usar".]
quarta-feira, 25 de maio de 2011
Algumas constatações deveriam ser bloqueadas automaticamente pelo cérebro, em prol da nossa saúde mental. Mas invariavelmente não são. Ao contrário daquilo que necessitaríamos, é justamente nos momentos mais inoportunos do percurso existencial, onde seria necessário sublimar, abstrair, que tais elementos propulsores das válvulas conclusivas, que passam boa parte da nossa estadia como viventes desativado, surgem energicamente.
Eis que me encontro em um fim de ciclo, tentando assimilar tudo o que for possível dentre os elementos que se fizeram substanciais na fase que encontra-se sendo superada, ou então, buscando um viés de observação otimista, fase que encontra-se sendo substituida pelo iniciar inevitável de um novo ciclo. Dessa forma, os olhares se voltam nostalgica analítica e saudosamente para tudo aquilo que foi ficando pelo caminho.
Depois de um longo processo de construção de relações, vínculos, desafetos, eis que definitivamente encontro-me partindo. Diferente das outras vezes, e sem nenhum teor de drama ou lamentação, dessa vez para não mais voltar.
Ok, até então, saudável e passível de assimilação!
A questão descabelatória fez-se da seguinte maneira. Supondo que você passe um período de tempo notável dividindo o mesmo ambiente com um determinado grupo de pessoas, que você imagina ser conhecedor ao menos dos aspectos elementares do seu ser. Imagina-se como um exímio suicida super sincero das relações sociais, sem titubear ao expor os comentários e opiniões que são solicitados, sem medir o grau de antipátia dos mesmos. E justamente quando você está de saída, passando possivelmente última vez pela porta em que corriqueiramente cruzava 'n' vezes ao dia, recebe um presente revelador que o leva do céu ao inferno num tempo incalculável de tão breve: Um livro dos Augusto Cury.
Sim, esse mesmo, justamente esse que cultivo o hobbie agradabilíssimo de criticar.
A princípio, ao ver que o presente tratava-se de um livro, a primeira idéia que surgiu foi: "Bahhh, todo esse tempo foi o bastante para esses caras me sacarem com precisão, afinal, o último ser a partir foi agraciado com um objeto proveniente dos desejos fúteis que nos toma!", e que sorriso largo botei no rosto! Mas, por mero padrão de comportamento, as coisas desandaram quando meus olhos identificaram a 'preciosidade' com que estava sendo agraciada.
Sim, um livro do Augusto Cury. E se isso não fosse o bastante (como nunca é), não se tratava simplesmente de tal. O conteúdo do livro, exatamente, o conteúdo do livro completou por absoluto a fatalidade: "Mulheres inteligentes, relações saudáveis", e como golpe final e fatal, o título da receita do bolo, quer dizer, do livro, vem com o complemento: "O livro que toda mulheres deveria ler antes de se relacionar".
Como condicionamento proveniente da minha elegância e gentileza, o sorriso continuou, mas a testa franziu em nome da minha sinceridade incurável.
E as perguntas se multiplicam ad infinitum desde então!
Afinal, transmiti uma imagem assim tão confusa a ponto que deixar brecha para que talvez tal leitura fosse capaz de me apetecer? Eu estava sendo sutilmente provocada? O responsável por comprar o livro seria um leigo absoluto em literatura? etc, etc...
Possivelmente morrerei na dúvida.
terça-feira, 24 de maio de 2011
“Me escondo dessas tuas histórias que me enredam cada vez mais no que não és tu, mas o que foste. Tento fugir para longe e a cada noite, como uma criança temendo pecados, punições de anjos vingadores com espadas flamejantes, prometo a mim mesmo nunca mais ouvir, nunca mais ter a ti tão mentirosamente próximo, e escapo brusco para que percebas que mal suporto a tua presença, veneno, veneno, às vezes digo coisas ácidas e de alguma forma quero te fazer compreender que não é assim, que tenho um medo cada vez maior do que vou sentindo em todos esses meses, e não se soluciona, mas volto e volto sempre, então me invades outra vez com o mesmo jogo e embora supondo conhecer as regras, me deixo tomar por inteiro por tuas estranhas liturgias, a compactuar com teus medos que não decifro, a aceitá-los como um cão faminto aceita um osso descarnado, essas migalhas que me vais jogando entre as palavras e os pratos vazios, torno sempre a voltar, talvez penalizado do teu olho que não se debruça sobre nenhum outro assim como sobre o meu. Tornarei sempre a voltar porque preciso desse osso, dos farelos que me têm alimentado ao longo deste tempo…”
- Caio Fernando Abreu.
sexta-feira, 13 de maio de 2011
De volta à velha cumplicidade...
Versos Íntimos
Augusto dos Anjos
Vês! Ninguém assistiu ao formidável
Enterro de tua última quimera.
Somente a Ingratidão - esta pantera -
Foi tua companheira inseparável!
Acostuma-te à lama que te espera!
O Homem, que, nesta terra miserável,
Mora, entre feras, sente inevitável
Necessidade de também ser fera.
Toma um fósforo. Acende teu cigarro!
O beijo, amigo, é a véspera do escarro,
A mão que afaga é a mesma que apedreja.
Se a alguém causa inda pena a tua chaga,
Apedreja essa mão vil que te afaga,
Escarra nessa boca que te beija!
quinta-feira, 12 de maio de 2011
Busca Vida
"Se for mais veloz que a luz,
então escapo da tristeza
Deixo toda a dor pra trás,
perdida num planeta abandonado no espaço.
E volto sem olhar pra trás"
então escapo da tristeza
Deixo toda a dor pra trás,
perdida num planeta abandonado no espaço.
E volto sem olhar pra trás"
terça-feira, 10 de maio de 2011
Clarice Lispector - Aprendendo a Viver
"Quando o amor é grande demais torna-se inútil: já não é mais aplicável, e nem a pessoa amada tem a capacidade de receber tanto. Fico perplexa como uma criança ao notar que mesmo no amor tem-se que ter bom senso e senso de medida. Ah, a vida dos sentimentos é extremamente burguesa”.
segunda-feira, 9 de maio de 2011
Susan Sontag (1933-2004)
"Amar magoa. É como se oferecer para ser esfolada, e sabendo que a qualquer momento a pessoa pode simplesmente ir embora levando sua pele"
domingo, 8 de maio de 2011
saudade do futuro que não houve
aquele que ia ser nobre e pobre
como é que tudo aquilo pôde
virar esse presente podre
e esse desespero em lata?
pôde sim pôde como pode
tudo aquilo que a gente sempre deixou poder
tanta surpresa pressentida
morrer presa na garganta ferida
raciocínio que acabou em reza
festa que hoje a gente enterra
pode sim pode sempre como toda coisa nossa
que a gente apenas deixa poder que possa.
Paulo Leminski
aquele que ia ser nobre e pobre
como é que tudo aquilo pôde
virar esse presente podre
e esse desespero em lata?
pôde sim pôde como pode
tudo aquilo que a gente sempre deixou poder
tanta surpresa pressentida
morrer presa na garganta ferida
raciocínio que acabou em reza
festa que hoje a gente enterra
pode sim pode sempre como toda coisa nossa
que a gente apenas deixa poder que possa.
Paulo Leminski
sexta-feira, 6 de maio de 2011
quarta-feira, 4 de maio de 2011
Das idéias fixas
Talvez eu tanto as deteste
em semelhante proporção
justamente pela característica que compartilham:
serem irresistíveis e estarem presentes
no desenrolar da mais ínfima e simplória ação
Eis o ponto que tropeço
e confirmo meus equívocos
ao mesmo tempo em que vos digo
e ponho meu segredo em risco
Elas surgem zombeteiras,
com porte impecável de vitória
com porte impecável de vitória
e rompante de riso
das minhas palavras simplórias
das minhas palavras simplórias
não deixam a poeira se assentar em seus ombros
em razão do desuso
em razão do desuso
não se inibem frente a possibilidade de inconveniência,
e certeza de abuso
e certeza de abuso
Suas idéias claras e sua graça
seguem fazendo escravos:
seguem fazendo escravos:
Tanto as Rimas Primárias,
quanto a Metáfora!
terça-feira, 3 de maio de 2011
Ahhh, os Humanos!
Essa característica grotescamente humana,
que é a necessidade de reconhecimento
Que nos despudora, e invariavelmente aprisiona
ainda irá nos proporcionar um sufocar lento e torturante
Em prol desse elemento obscuro
há de se chafundar na frustração degradante...
segunda-feira, 2 de maio de 2011
Paulo César Pinheiro - Soneto do mar corrente ou do amor trágico
Chegaste estrela, foste a mais cadente
No mar corrente desta vida errante.
E em meu semblante há muito descontente
Se fez presente então paixão gigante.
Chegaste estrela, foste a mais brilhante
No mesmo instante em que fiquei contente.
Foste inocente como a flor flagrante
E foste amante por amor somente.
Chegaste estrela, foste a mais ardente
E de repente foste a mais distante
Na variante de um amor poente.
Partiste estrela, na maré vazante
E eu de amante me tornei descrente
Tragicamente, amor, tragicamente...
domingo, 1 de maio de 2011
Neste domingo de sol e de júpiter estou sozinha em casa. Dobrei-me de repente em dois e para frente como em profunda dor de parto. Nunca esquecerei esse domingo sangrento. Para cicatrizar levará tempo. E eis-me aqui dura e silenciosa e heróica. Todas as vidas são vidas heróicas.
...Clarice Lispector
Joana Maria Guimarães
Sempre há uma ausência
presente
na sala de visitas
no dormitório
em cada pequeno pedaço
da colcha de retalhos
sobre a cama
Porque
(qual o por quê?)
os dias construídos com tijolos
de distâncias
fraturas
e à janela um olhar passeia
sempre à procura
presente
na sala de visitas
no dormitório
em cada pequeno pedaço
da colcha de retalhos
sobre a cama
Porque
(qual o por quê?)
os dias construídos com tijolos
de distâncias
fraturas
e à janela um olhar passeia
sempre à procura
Mia Couto
Não saberei nunca
dizer adeus
Afinal,
só os mortos sabem morrer
Resta ainda tudo,
só nós não podemos ser
Talvez o amor,
neste tempo,
seja ainda cedo
Não é este sossego
que eu queria,
este exílio de tudo,
esta solidão de todos
Agora
não resta de mim
o que seja meu
e quando tento
o magro invento de um sonho
todo o inferno me vem à boca
Nenhuma palavra
alcança o mundo, eu sei
Ainda assim,
escrevo.
dizer adeus
Afinal,
só os mortos sabem morrer
Resta ainda tudo,
só nós não podemos ser
Talvez o amor,
neste tempo,
seja ainda cedo
Não é este sossego
que eu queria,
este exílio de tudo,
esta solidão de todos
Agora
não resta de mim
o que seja meu
e quando tento
o magro invento de um sonho
todo o inferno me vem à boca
Nenhuma palavra
alcança o mundo, eu sei
Ainda assim,
escrevo.
MARCIN ŚWIETLICKI
FUMANDO
Pergunto: porque é que os não fumadores
sobem sem escrúpulos aos compartimentos
para fumadores? Porque querem impôr-se? Porque
parecem sempre nauseados?
Cigarro, meu velho amigo.
Passei contigo mais tempo do que com qualquer outro.
Estamos-nos a destruir mutuamente, num cordial
compromisso.
Pergunto: porque não apreciam
a nossa solidão,
o nosso valor ingénuo, nosso
fogo, cinza?
(Tradução por Maciej Ziętara e Maurício Barrientos, incluida no livro “101 [6 poetas polacos contemporáneos]”, RIL Editores, Santiago do Chile, 2008)
Pergunto: porque é que os não fumadores
sobem sem escrúpulos aos compartimentos
para fumadores? Porque querem impôr-se? Porque
parecem sempre nauseados?
Cigarro, meu velho amigo.
Passei contigo mais tempo do que com qualquer outro.
Estamos-nos a destruir mutuamente, num cordial
compromisso.
Pergunto: porque não apreciam
a nossa solidão,
o nosso valor ingénuo, nosso
fogo, cinza?
(Tradução por Maciej Ziętara e Maurício Barrientos, incluida no livro “101 [6 poetas polacos contemporáneos]”, RIL Editores, Santiago do Chile, 2008)
Vontando para caverna?
Regresso agora às palavras
esse antifício de antigamente
que se renova
de acordo com as necessidades
mutável
Porto
Conforto
Onde me reporto
ao inacessível de mim
Onde cuspo
o que ao outro se faz desintessante
E me desintegro
em frases sem rima
Linhas sem ritmo e sem métrica
Assim como me faço deveras...
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