terça-feira, 12 de abril de 2011

sexta-feira, 8 de abril de 2011

aos poucos
rasgo o espelho da memória.
redesenhando novos traços
esculpidos em voo livre
sob a estrela que roubei
num olhar moribundo.

aos poucos
enterro o coração de papel.
esmagando na poeira do vento
as palavras negadas.

Ana Barros

terça-feira, 5 de abril de 2011

quarta-feira, 30 de março de 2011

terça-feira, 29 de março de 2011

sábado, 26 de março de 2011

Um cigarro
ninguém tem
um cigarro?
um copo de vinho
um amor perdido
uma causa iludida
uma angústia a mais?
alguém quer trocar
de veias
de sangue
de coração
de pulmões?
um cigarro
ao menos
ninguém tem
um cigarro?



Carlos Alberto Machado
Fumam à janela, o vento frio
desfaz o fumo, os dedos tremem.
Não sabem uns dos outros,
espalhados pela cidade, mas
procuram as luzes ainda acesas
noutras casas. Noite dentro,
o silêncio dos que dormem
é uma afronta, desleixo pueril
de quem consegue ignorar
as facadas do tempo, a areia
entre os dedos, o sobressalto.





José Mário Silva
“(…) Acreditar na multidão é excelente. Mas, no dia em que a multidão falha, se o homem não acredita em si, toda a sua vida falha também.
Viver com a multidão é excelente. Mas quando se pode viver também sem ela, quando a sua perda é capaz de não deixar desespero: quando se participa do seu convívio, sem, no entanto, se ficar nessa dependência miserável que oprime e escraviza, e torna infelizes as criaturas quando não encontram um apoio em redor de si.
Servir à multidão é excelente. Mas sem ser pela recompensa que venha. Única maneira de resistir, se ela não vier.

O homem mais forte é o homem capaz de saber ficar mais só. É o homem que vence os infortúnios, excedendo em virtude o que eles trouxerem em dimensões. (…)”



MEIRELRES, Cecília, Crônicas de educação
Cecília Meireles (Rio de Janeiro, 7/11/1901 – Rio de Janeiro, 9/11/1964)

sexta-feira, 18 de março de 2011

quinta-feira, 17 de março de 2011

segunda-feira, 14 de março de 2011

ouço o rumor do vento
vai
alma vai
até onde quiseres ir

al berto

quinta-feira, 10 de março de 2011

quinta-feira, 3 de março de 2011

terça-feira, 1 de março de 2011

segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

sábado, 26 de fevereiro de 2011

[entre o sexto sentido
e a paranóia
voa a imaginação]

quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011


Se tens a minha alma,
 E se possuis as chaves para libertação dos frutos doces do meu imaginário
Estas no domínio de todas as minhas inimagináveis determinações

E se danço livremente no palco infindo dos seus pensamentos
Tendo como limite apenas as barreiras daquilo que ainda não conheço
Faço-me doce no minuto eterno da entrega

segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011



[É tempo de espera e silêncio
Tempo de calar para decifrar as entrelinhas dos ensurdecedores ruídos provocados por tantos abalos sísmicos
Tempo de caminhar na medida em que as pernas alcançam
Tempo de evitar os saltos no escuro
Tempo de necessidade irresponsável de pressa
De trabalho constante com o autocontrole
E se esse não valer, tempo de solicitar os trabalhos mal feito do auto-engano...]





terça-feira, 15 de fevereiro de 2011

segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

sábado, 12 de fevereiro de 2011

quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

quinta-feira, 3 de fevereiro de 2011

Ah, eu bebi.Com que sede eu bebi.
Mas eu também estava pleno de mundo e, bebendo,
eu mesmo
transbordei.

(Rainer Maria Rilke)

segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

Jessica Harrison




Kees van Dongen



O corpo não espera. Não. Por nós
ou pelo amor. Este pousar de mãos,
tão reticente e que interroga a sós
a tépida secura acetinada,
a que palpita por adivinhada
em solitários movimentos vãos;
este pousar em que não estamos nós,
mas uma sêde, uma memória, tudo
o que sabemos de tocar desnudo
o corpo que não espera; este pousar
que não conhece, nada vê, nem nada
ousa temer no seu temor agudo...

Tem tanta pressa o corpo! E já passou,
quando um de nós ou quando o amor chegou.


Jorge de Sena

quinta-feira, 27 de janeiro de 2011

quinta-feira, 20 de janeiro de 2011

Caio Fernando Abreu - PEQUENAS EPIFANIAS

Nada de mal me aconteceria, tinha certeza, enquanto estivesse dentro do campo magnético daquela outra pessoa. Os olhos da outra pessoa me olhavam e me reconheciam como outra pessoa, e suavemente faziam perguntas, investigavam terrenos: ah você não come açúcar, ah você não bebe uísque, ah você é do signo de Libra. Traçando esboços, os dois. Tateando traços difusos, vagas promessas.

Nunca mais sair do centro daquele espaço para as duras ruas anônimas. Nunca mais sair daquele colo quente que é ter uma face para outra pessoa que também tem uma face para você, no meio da tralha desimportante e sem rosto de cada dia atravancando o coração.

quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

Estais de volta!
Espirais de luz...
Múltiplas faces!
Cala em mim
a corrosão do desencanto.

Dá-me o direito
de tê-la assim:
desejada e liberta
— infinitamente! —


Helena Amin

Kees van Dongen

terça-feira, 18 de janeiro de 2011

Elaine G. Coffee

Thomas Wilmer Dewing (1851-1938)






É possível que a poesia não lhe toque da mesma maneira que deveras paralisa os meus sentidos, e que as palavras sejam apenas algo que lhe surgem como meio óbvio e elementar de interação com os demais. E que minhas músicas cheguem até você como mera prova cabal do meu pieguismo desmedido, descontextualizado, e fora de tudo o que poderia esperar dentro dos padrões que lhe foram apresentados. Pode ser também que a minha cafonice o envergonhe em determinadas circustâncias. Ou que, por vezes, o que eu venha a dizer seja totalmente estranho, descolado da aparente realidade que tomas como única e certa. Mas, meu bem, estas em tudo aquilo que sou e que amo, mesmo sendo possível que talvez nunca entenda...

Francesco Brunery (1849 – 1926)



sexta-feira, 14 de janeiro de 2011

“E tem gente maravilhosa que, de repente, vai ficando longe, difícil de ver – e aí dança. Mas também acho que aquilo que é bom, e de verdade, e forte, e importante – coisa ou pessoa – na sua vida, isso não se perde. E aí lembro de Guimarães Rosa, quando dizia que “o que tem de ser, tem muita força”. A gente não tem é que se assustar com as distâncias e os afastamentos que pintam.”




- Caio Fernando Abreu.

Amanheceu!

sexta-feira, 31 de dezembro de 2010

Vai, ano velho

Vai, ano velho, vai de vez,
vai com tuas dívidas
e dúvidas, vai, dobra a ex-
quina da sorte, e no trinta e um,
à meia-noite, esgota o copo
e a culpa do que nem me lembro
e me cravou entre janeiro e dezembro.

Vai, leva tudo: destroços,
ossos, fotos de presidentes,
beijos de atrizes, enchentes,
secas, suspiros, jornais.
Vade retrum, pra trás,
leva pra escuridão
quem me assaltou o carro,
a casa e o coração.
Não quero te ver mais,
só daqui a anos, nos anais,
nas fotos do nunca-mais.

Vem, Ano Novo, vem veloz,
vem em quadrigas, aladas, antigas
ou jatos de luz moderna, vem,
paira, desce, habita em nós,
vem com cavalhadas, folias, reisados,
fitas multicores, rebecas,
vem com uva e mel e desperta
em nossso corpo a alegria,
escancara a alma, a poesia,
e, por um instante, estanca
o verso real, perverso,
e sacia em nós a fome
- de utopia.

Vem na areia da ampulheta com a
semente que contivesse outra se-
mente que contivesse ou-
tra semente ou pérola
na casca da ostra
como se
se
outra se-
mente pudesse
nascer do corpo e mente
ou do umbigo da gente como o ovo
o Sol a gema do Ano Novo que rompesse
a placenta da noite em viva flor luminescente.

Adeus, tristeza: a vida
é uma caixa chinesa
de onde brota a manhã.
Agora
é recomeçar.
A utopia é urgente.
Entre flores de urânio
é permitido sonhar.



Affonso Romano de Sant'Anna

sábado, 25 de dezembro de 2010

Às vezes quero crer mas não consigo
É tudo uma total insensatez
Aí pergunto a Deus: escute, amigo
Se foi pra desfazer, por que é que fez?


(Vinicius de Moraes)

quinta-feira, 23 de dezembro de 2010

[Então fingirás - aplicadamente, fingirás acreditar que no próximo ano tudo será diferente, que as coisas sempre se renovam]

 Caio Fernando Abreu

Constatações

Antes o furor do sentimento excessivo
que o ardor de um coração ressequido

quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

Alex Kanevsky

[Essa mania despropositada que as pessoas possuem de estar sempre partindo... Meu reclame incansável. Contudo, em um surto de lucidez, indago-me: Se partindo elas me ferem, como sentem-se, então, com o meu nunca estar?]

sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

Eternidade inútil - Cecília Meireles

Até morrer estarei enamorada
de coisas impossíveis:

tudo que invento, apenas,
e dura menos que eu,
que chega e passa.

Não chorarei minha triste brevidade
unicamente a alheia,
a esperança plantada em tristes dunas,
em vento, em nuvens, n'água.

A pronta decadência,
a fuga súbita
de cada coisa amada.

O amor sozinho vagava.
Sem mais nada além de mim...
numa eternidade inútil.

quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

De quando pensa-se em chafurdar...

Entre aquilo que há de ser estabelecido
E tudo o que necessita ser restabelecido
Reside uma infinidade de possibilidades
Por vezes tortuosas, por ora nauseantes

É quando, por alguns instantes,
Cogita-se o quão tranqüilo seria existir
Caso a existência fosse uma instituição que exigisse uniforme.
Essa ausência sem nome...
[por quem a voz gritaria?]
Essa falta sem rosto...
[em que imagem o possível desesperar se firmaria?]
Essa saudade do inominável...
[por que elemento eu reclamaria?]

A mesma lembrança persistente
Do que outrora,
fez-se terreno fértil no imaginário
Mas que fora,
objetivamente,
deveras fantasioso e inexistente

Esse desejo voltado unicamente para dentro de si
Sem forma, sem gosto...
mas de plenitude inquestionável

E essa vontade do outro,
possuidor da doçura que o meu ser não abriga.

O despertar da controvérsia
A persistência do paradoxo

O mesmo espaço impreenchível e em expansão...

terça-feira, 7 de dezembro de 2010

Não deixe portas entreabertas
Escancare-as
Ou bata-as de vez.
Pelos vãos, brechas e fendas
Passam apenas semiventos,
Meias verdades
E muita insensatez.

Cecília Meirelles

segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

Oscila minha amargura
Entre delírios
Falta de nexo
E falsa brandura

Adormecem os meus sentidos
Quando por instantes
Julgo os males assimilados
E os tormentos de outrora esquecidos

O Caos me assola
E a existência degradante tarda a findar
Arrastando a matéria inerte
Em meio aos prazeres escassos

Do [auto] apelo desesperado...

Procura-se,
dentro ou fora,
Reservatório de forças
para atravessar dezembro
sem ceder ao doce encanto da loucura

sábado, 4 de dezembro de 2010

Dos tiros no pé...

Ah! Os intrinsecamente sinceros!
Alvos fáceis em todas as circunstâncias
Até os que associam a tal estigmatizante característica à discrição
Falsamente proclamada como capaz de promover a manutenção da coexistência dos poucos habilitados para a mesma
Analogicamente posta como possuidora dos efeitos da água
Solvente universal de qualquer substância
Nem mesmo os mais bem articulados artifícios são capazes de camuflar tal peculiaridade
Nem a discrição os permite escaparem ilesos
Dos efeitos invariavelmente devastadores
Da incurável e espalhafatosa sinceridade

sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

Alice Vieira - Cadernos de Agosto

" “Nenhum homem é de fiar”, diz sempre a Luciana ao fim-de-semana.
As paixões eternas da Luciana duram quase sempre oito dias. Ao fim desse tempo ela morre de amor, descobre que afinal nasceu para freira ou deixa-se convencer pela Super-fixe que as mulheres solteiras são as de maior encanto e sedução.
Depois na segunda-feira seguinte esbarra com um qualquer moreno de olhos verdes (loiro de olhos azuis, moreno de olhos castanhos, loiro de olhos verdes, ruivo de olhos pretos, para o caso tanto faz), e volta tudo ao princípio.”


Alice Vieira (Lisboa, 1943)
Jornalista e escritora, licenciada em Filologia Germânica.