quinta-feira, 21 de junho de 2007

Noite de inferno (Artur Rimbaud)

Bebi um grande gole de veneno. - Três vezes bem-dito o conselho
que até mim chegou! Abrasam-se-me as entranhas. A violência do
veneno convulsiona-me os membros, desfigura-me, atira-me ao solo.
Morro de sede, sufoco, não posso gritar. É o inferno, a condenação
eterna! Olhai como o fogo cresce. Queimo como devo queimar! Sai,
demônio!
Havia entrevisto a conversão ao bem e à felicidade, a salvação.
Posso descrever a visão? O ar do inferno não tolera hinos! Eram
milhões de criaturas encantadoras, um suave concerto espiritual, a
força e a paz, as nobres ambições, que sei eu?
As nobres ambições!
E é ainda a vida! - Se a condenação é eterna! Um homem que quer
mutilar-se está condenado, não é assim? Acredito-me no inferno,
logo estou nele. É o cumprimento do catecismo. Sou escravo de meu
batismo. Pais, fizestes a minha desgraça e a vossa! Pobre inocente! -
O inferno nada pode contra os pagãos. - É a vida. Mais tarde, as
delícias da condenação serão mais profundas. Um crime, depressa,
que as leis humanas me precipitem no nada.
Cala-te, mas cala-te!... Esta é a vergonha, esta a repreensão: Satã que
diz que o fogo é ignóbil, que minha cólera é terrivelmente louca. -(...)

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