sábado, 23 de maio de 2009

Há uma espécie de pessoa que surge apenas de forma inesperada, súbita e intensamente, nunca estão entre aqueles que nos cercam. Não são passiveis de serem categorizadas, os conceitos fogem quando se trata de tais seres. Quando você nota, eis que lá estão! Por mais que digam o caminho que trilharam até chegar nesse ponto onde você também se encontra, ainda assim, fica certa impressão de falta de sentido no que tange tal aparição, surgem envoltos em um ar nonsense, trazem consigo um aparato existencial inconfundível, no sentido de serem exatamente correspondentes as suas idealizações, no semblante feições acolhedoras para serem eternamente contempladas, não exigem que se selecionem virtudes em meio a suas falas, conseguem ser impressionantes até mesmo nos suspiros, como se tivessem preparado minuciosamente as palavras a serem proferidas, porém, exigem respostas e decisões rápidas, a coexistência com eles não permite erros durante o processo, nunca há tempo para falhas, mesmo as mais ínfimas, aquelas que na vida cotidiana se dissolvem em meio a tantos outros fatos corriqueiros, qualquer deslize os leva para distancias as quais os olhos nunca alcançariam, fútil olhar mais uma vez. Surgem para deixar aquele gosto doce na boca de que idealizações podem sim encontrar objetos correspondente, surgem como a própria personificação das idealizações, para provar que nunca se está realmente preparado para os mais intensos desejos... E se vão, consolidando frustrações eternas.

sábado, 16 de maio de 2009

Havia todos os motivos possíveis e prováveis para adentrar em um estado de angústia generalizada. Ela estava sozinha, sem pretensões que pudesse lhe causar interesses, não havia possibilidades que despertasse seu entusiasmo, porém, de forma incompreensível dentro de si havia aquele sentimento de paz medíocre, infundada, sem grandes motivações, era apenas uma recusa ao sofrer, sentido esse que de tanto se fazer presente em seu percurso imaginava ela já estar controlado, sofreria quando imaginar ser conveniente.
Sim, até o sofrimento exige certa coerência, um contexto determinado, simplesmente sofrer, despretensiosamente seria um despropósito, e viver já era o despropósito mais significativo que ela carregava consigo, tolo seria se firmar em novos desalentos, a não ser que as motivações e os estímulos fossem de dimensão superior as suas defesas.
Chovia, no momento mais impróprio, não havia fuga, aquilo que mais lhe agradava na natureza havia acontecido em um momento inoportuno. Nada possibilitava que ela se escondesse, a necessidade de proteção a direcionava sem muitas escolhas para entre os mortais, meros mortais, que ali se faziam presentes. Todos com seus motivos que consideravam digno, essa falsa dignidade que nos move e nos expõe as situações indesejadas.
Não fora suficientemente feliz na arte de ficar alheia aos seres que a cercava, com aquela espécie de paranóia neurótica que a acompanhou durante todo o seu percurso existencial, imaginava estar sendo observada, tinha medo que seus pensamentos reluzissem, tomassem forma, se personificassem com o intuito apenas de expô-la ao ridículo... Aquilo que ela mais temia: o ridículo, não pelo ridículo em si, mas sim pela atenção que o mundo voltava ao ridículo, pela exposição que ele proporcionava, ela nunca estaria preparada para controlar suas indagações perante uma quantidade maior do que o esperado de olhos voltados para ela, enlouqueceria, instantaneamente. E era exatamente isso que ela pensava que a chuva causaria, nesse ambiente tão despreparado para tal fenômeno. A quantidade limitada de pessoas e de estímulos visuais faria com que qualquer movimento fosse perceptível. Supunha até estar bem localizada, nessa espécie de dialogo interior que executava para que a insanidade não tomasse conta da ínfima parte sadia de si que ainda restava.
O medo que superava todos os outros, mas que não lhe causava sofrimento, era o da loucura, sentia-se apta a ocupar o lugar dos loucos no mundo, pensava até possuir traços marcantes do estereotipo destes.
Ela carregava nos olhos um misto de força e de fraqueza, diferente dos outros, sentia na expressão dos que a observava existindo, certa perplexidade. Isso que se mesclava dentro dela estava longe de qualquer espécie de mediania, eram extremos, oscilações constantes, diferente de qualquer bipolaridade, pensava ela ter certo controle sobre seu mundo interior que desconhecia. Havia uma fera coberta pelo seu semblante composto de segurança, doçura e a mais fina ironia. Fera esta que ela domava com pequenos agrados, carícias, elogios, facilmente influenciável, mas que necessitava de atenção constante. Incansável, exigia um trabalho diário, era preciso dispor de tempo e de paciência, tudo isso em prol da sua sanidade, e do bom andamento de tudo aquilo que compunha seu "mundo exterior". E era justamente por isso que ela temia tanto enlouquecer, não era possível avistar por quanto tempo seria viável negar seus instintos mais sinceros, seu desejo de nada, sua vontade incontrolável de sentar em uma poltrona macia e deixar o mundo seguir sem sua interferência. Longe de qualquer desejo de morte, ela queria ser apenas expectadora, a vida não lhe interessava o suficiente para haver vontade de coexistência, os poros da vida jorravam algo patético que ela achava deplorável, não queria ter parte naquilo. Se acontecesse de forma espontânea, assim como ela imaginava ocorrer com as outras pessoas, seria de certa forma, aceitável, mas ela não fora preparada para simplesmente existir, havia algo que ultrapassava o existir, ou que ficava anterior a este, a medida exata imprescindível a qualquer ser vivente, havia lhe faltado.
O ônibus haveria de chegar, para fim da sua pré-angústia.

sexta-feira, 15 de maio de 2009

Tenho dado voltas vertiginosas na roda da vida, porém, meu desejo continua sendo o de ficar ali embriagada de vinho, virtude ou poesia, parada, pateta, ridícula... Preencher-se de vazio é a imbecilidade mais paradoxal que existe, ludibriar-se com recursos tolos provoca lacunas ainda maiores do que as já existentes...

segunda-feira, 11 de maio de 2009



Não havia motivos para buscar as causalidades, ela nunca havia entendido qual era a utilidade de encontrar a mola propulsora dos males, ela já conhecia as suas motivações e era plenamente consciente da sua irreversibilidade.
Tratava-se apenas de uma fase, mais um episódio de suas crises cíclicas, assim como nas outras circunstâncias, os sintomas viriam não se sabe se com a mesma intensidade, mas logo desapareceriam, subitamente, como o cair da noite, inevitável.
Aprendera a adoecer docemente. Encontrara na dor um colo macio e acalentador. Aprofundara-se na própria falta de objetividade, saída de emergência para quando a vida proporciona entusiasmos tão tênues como o gosto de uma alface, e a dor estaria momentaneamente suspensa, como poeira espanada logo voltaria a desabar.